Críticas, matérias, entrevistas e reportagens da carreira de Orlando Fassoni.
O material não segue nenhuma ordem, seja cronológica, seja de categoria ou qualquer outra. É apenas um registro digital de muitos anos de jornalismo.

4 de março de 2008

O FIM DO MUNDO

O cinema já nos convenceu de que o mundo já acabou há muito tempo, e que os teimosos somos nós que, apesar de todas as tragédias, insistimos em continuar vivendo como se nada tivesse acontecido. Nostradamus (1503-1566), o médico e astrólogo francês, vai continuar sendo ridicularizado enquanto existir alguém filmando histórias sobre a hecatombe, e certamente ficaria maluco se soubesse e visse tudo o que o cinema já mostrou acerca do nosso destino, aliás nada agradável. Azar dele porque, desde os anos em que viveu até hoje, suas teorias e profecias foram - e continuam sendo – temas sobre os quais mergulham escritores, dramaturgos, aventureiros, cineastas, picaretas de imagens e vendedores de catástrofes dos mais variados tipos.
De que forma o mundo pode acabar?. Pergunta que a filha de um amigo deve responder no trabalho solicitado pela professora no curso de Comunicação. O mote é o recente “Eu Sou a Lenda” (I Am Legend, 2007), filme do americano Francis Lawrence ainda em exibição em cinemas da cidade. Will Smith é um cientista do Exército norte-americano que em 2012, três anos após a destruição global provocada por um vírus, pensa ser o único sujeito que sobrou na Terra e vaga pela destruída Nova York acompanhado por uma cadela viralata, tão assustada quanto ele, e passa o tempo conversando com bonecos e bonecas de vitrines, manequins que ajudam o herói a vencer os tediosos dias que sucedem ao desastre da humanidade. Mas Robert Neville acaba descobrindo que não é o último sobrevivente. Tem mais, só que o resto virou um bando de zumbis, tipos selvagens que vivem nos subterrâneos porque não suportam a claridade.
A história vem de uma ficção do escritor Richard Matheson, um autor inspiradíssimo que o cinema utilizou várias vezes e que tem certa queda por histórias ficcionais com poucos personagens e uma avalanche de surpresas e sustos. Basta lembrar que é dele a trama muito bem urdida de “Duel”, que Steven Spielberg adaptou para a televisão em 1971 no seu hoje cult “Encurralado”, um filme sem nenhuma pretensão que acabou virando um sucesso mundial quando transferido para a tela grande e colocou o nome de Spielberg no rol dos melhores e mais criativos diretores de nossa época. Tal qual o cientista de “Eu Sou a Lenda”, lutando contra forças que desconhece, Dennis Weaver é o caixeiro viajante obrigado a enfrentar o psicopata que o persegue dirigindo um caminhão tanque que assume os contornos de um dinossauro e cujo rosto nunca aparece. Um ardiloso golpe que tanto Matheson quanto Spielberg usaram com riqueza para assustar quem leu o livro e depois viu o filme. O personagem vivido por Will Smith em “Eu Sou a Lenda” nos faz lembrar o náufrago do recente filme onde Tom Hanks, para não ficar louco na ilha onde vai parar após a queda do avião no mar, encontra numa bola de vôlei, que chama de Wilson - nome da marca da bola, grande merchandising -, a única companheira para conversar e contar suas desilusões e esperanças enquanto espera que surja um resgate.
A ficção de Richard Matheson teve duas versões anteriores a esta que está em exibiçãonos cinemas, e é sobre elas que me pedem informações para o trabalho escolar. Bem, a primeira, segundo os estudiosos do cinema de ficção futurista, ou científica, foi de 1963, uma co-produção ítalo-americana intitulada “The Last Man on Earth” e exibida no Brasil como “Mortos Que Matam”, dirigida por Sidney Salkov, com Vincent Price no papel do cientista Robert Neville. Não localizei outras referências ao filme, a não ser que, na versão italiana, levou o título de “Vento di Morte”, assinada.por um tal de Ubaldo Ragona que ninguém por aqui deve conhecer.
Em 1971 apareceu “A Última Esperança da Terra” (The Omega Man), uma produção americana dirigida por Boris Sagal, do segundo ou terceiro time de realizadores, em nível de criação, onde Charlton Heston é o mocinho. O fim do mundo é situado em 1975. E Heston, imune aos efeitos da guerra atômica graças a um soro, tem de enfrentar as pessoas que sofreram mutações, são “fotófobas” e agrupam-se numa família liderada por um fanático religioso de nome Mathias. `Se levarmos em consideração as fantasias desta versão e as que estão em “Eu Sou a Lenda”, o filme com Will Smith leva vantagem graças aos melhores efeitos especiiais obtidos via computação e pelos ótimos enquadramentos do cenário da Nova York aniquilada. Além do que Smith, bom ator, garante a ligação entre ele e o espectador, e é provável que os espectadores de hoje nem sabem quem foi Charlton Heston.
Para ilustrar melhor o trabalho da aluna, tem mais umas informações. O escritor Richard Matheson escreveu roteiros para o cinema e adaptações para filmes de suspense, horror, terror etc. Entre eles estão “A Filha de Satã”, de 61, “As Bodas de Satã”, 69, a versão de “O Incrível Homem Que Encolheu”, de 57, dirigida por Jack Arnold, também baseado em livro seu, e trabalhos para a série de filmes do diretor Roger Corman baseados em livros de Edgar Allan Poe. O fim do mundo não seria melhor nem mais imaginativo sem as histórias de Matheson.
Aliás, fim de mundo não é novidade no cinema. Dezenas de filmes trataram do tema desde os anos 30, ou até antes, e cito uma lista de alguns, a maioria de baixa qualidade mas que os cinéfilos curtem até hoje porque são raridades que você não vai encontrar em nenhuma locadora de vídeo. Por exemplo: “A Destruição do Mundo”, “Os Últimos Cinco”, “Três Mil Anos Depois de Cristo”, “Vinte Milhões de Léguas a Marte”, “A Hora Final!, “A Máquina do Tempo”, “O Dia em Que a Terra se Incendiou” (título horripilante), “Pânico no Ano Zero” e por aí. Mas, já nos anos 60, nasceram obras notáveis sobre o tema fim de mundo. Lembram-se de “Doutor Fantástico”, que Stanley Kubrick realizou em 1963, com a magnífica atuação de Peter Sellers fazendo três personagens, e o clássico final do cowboy montado na bomba atômica?. A maioria dos filmes não passou de bobagens. Mas o gênero tem seus clássicos. Outro é “Limite de Segurança”, de Sidney Lumet, de 64, e outro ainda é “A Guerra dos Mundos”, que ganhou recentemente nova versão assinada por Steven Spielberg. E não podemos esquecer a série “Planeta dos Macacos”, quatro filmes assinados por diretores menos cotados como Franklin J.Schaffner, Ted Post, Don Taylor e J.Lee Thompson.. O cinema, enfim, já destruiu o mundo muitas vezes, mas o mundo ainda não acabou.

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi, Fassoni. MORTOS QUE MATAM, a primeira versão, com o Vincent Price, saiu em DVD no Brasil. Primeiro por um desses selos que vendem DVDs a preço de banana (dava para achar por R$ 12,90). Agora saiu uma outra versão, que estão vendendo por R$ 42,90 (a master dos dois filmes é a mesma, mas é que essa distribuidora nova costuma cobrar preços exorbitantes mesmo). Se a pessoa que está pesquisando souber fuçar, pode achar a versão original baratinho por aí. Sobre PLANETA DOS MACACOS, são cinco, e não quatro filmes: PLANETA DOS MACACOS, DE VOLTA AO PLANETA DOS MACACOS, A FUGA DO PLANETA DOS MACACOS, A CONQUISTA DO PLANETA DOS MACACOS e A BATALHA NO PLANETA DOS MACACOS. Fim do mundo mesmo só os dois primeiros mostram (os outros 3 seriam a terra rumando para o fim do mundo, o que só acontece no final de A BATALHA).